A partir de Os Cantos de Maldoror, a obra-prima literária que Isidore Ducasse, sob o pseudónimo de Conde de Lautréamont, deu à estampa nos finais do séc. XIX, os Mão Morta, com os dedos de alguns cúmplices, estruturaram um espectáculo singular onde a música brinca com o teatro, o vídeo e a declamação.
Aí se sucedem as vozes do herói Maldoror e do narrador Lautréamont, algumas imagens privilegiadas das muitas que povoam o livro, sem necessidade de um epílogo ou de uma linearidade narrativa, ao ritmo da fantasia infantil – o palco é o quarto de brinquedos, o espaço onde a criança brinca, onde cria e encarna personagens e histórias dando livre curso à imaginação.
Em similitude com a técnica narrativa presente nos Cantos, a criança mistura em si as vozes de autor, narrador e personagem, criando, interpretando e fazendo interpretar aos brinquedos/artefactos que manipula as visões e as histórias retiradas das páginas de Isidore Ducasse, dando-lhes tridimensionalidade e visibilidade plástica. São esses quadros/excertos, que se sucedem como canções mas encadeados uns nos outros, recorrendo à manipulação vídeo e à representação, que fazem o espectáculo.
Como um mergulho no mundo terrível de Maldoror, povoado de caudas de peixe voadoras, de polvos alados, de homens com cabeça de pelicano, de cisnes carregando bigornas, de acoplamentos horrorosos, de naufrágios, de violações, de combates sem tréguas… Sai-se deste mundo por uma intervenção exterior, como quem acorda no meio de um pesadelo, como a criança que é chamada para o jantar a meio da brincadeira – sem epílogo, sem conclusão, sem continuação!
Maldoror – o disco - é uma edição de luxo, limitada a 3.000 exemplares e vendida exclusivamente nos teatros onde o espectáculo é apresentado, que tem o formato de um pequeno livro de capa rígida forrada a tecido contendo os excertos de Os Cantos de Maldoror utilizados acompanhados por ilustrações da artista plástica Isabel Lhano. Não haverá reedições, pelo que esta é uma das poucas oportunidades de adquirir o disco.
OS CANTOS DE MALDOROR (o livro)
Na Paris sitiada de 1870 e em vésperas do levantamento da Comuna morre aos 24 anos o desconhecido Isidore Ducasse. No entanto este misterioso “homem de letras” deixava atrás de si um formidável empreendimento de demolição de que o romantismo envelhecido e o Segundo Império à beira do desastre não seriam as únicas vítimas. Os seus “Os Cantos de Maldoror”, impressos no ano anterior sob o pseudónimo de O Conde de Lautréamont, não poupam nenhuma autoridade nem nenhum dogma.
Sob a aparência de um herói do Mal, negativo dos heróis românticos então em voga, Maldoror é a personagem central da narrativa estruturada em Cantos à maneira das epopeias clássicas. Mas Maldoror é muito mais que um herói do Mal, é sobretudo um combatente da liberdade que nos revela as consequências de uma dupla alienação: enquanto a interiorização dos interditos morais e religiosos nos confisca os desejos, as marcas de uma linguagem imobilizada contrariam-nos a livre expressão.
Se a primeira alienação ganha denúncia no combate encarniçado de Maldoror contra o Criador e a religião e na natureza obsessivamente erótica dos seus crimes, relembrando a animalidade e a agressividade que a Igreja associa à sexualidade, já a segunda é exposta pela recorrência a artifícios literários, da interpelação do leitor à confusão entre narrador e personagem, da ausência de linearidade narrativa à constante sobreposição de formas literárias, como se ao combate encarniçado contra o Criador correspondesse estranhamente uma luta da escrita contra uma censura latente. Apesar disso, o texto não perde balanço, antes, como uma espiral ou um turbilhão, ganha um movimento rodopiante, de reposição e de renovação, de repetição e de modulação, com novos enredos sempre a arrancarem para logo abortarem, com constantes intromissões e divagações a impedirem a narração de avançar, não abordando novos relatos senão para voltar a tropeçar no mesmo episódio indizível, deixando entrever o que se segue para melhor o ocultar, tal um segredo que se quer contar mas não se consegue, criando assim uma tensão que vai alimentar toda a obra, que dá a impressão de gravitar à volta de um centro sempre fugidio.
APRESENTAÇÕES
“Maldoror”, por Mão Morta, estreou em Braga, no Theatro Circo, a 11 de Maio de 2007, com sala esgotada, a que se seguiram novas apresentações, também com sala esgotada, ainda no Theatro Circo, a 12 de Maio, e no Centro de Artes e Espectáculos de Portalegre, a 19 de Maio, tendo sido entusiasticamente recebido quer pelo público quer pela crítica.
“ «Os Cantos de Maldoror» não foi apenas mais um concerto dos Mão Morta. É «Maldoror por Mão Morta». É uma encenação de luz, música, vídeo e declamação. É o universo obscuro e perverso de Conde de Lautréamont, o autor dos “Cantos”, contado e musicado pela banda de Braga através de uma peça de teatro, onde todos os elementos da banda desempenham um papel. É, de facto, uma peça inesquecível e brilhante” Ana Baptista in Disco Digital de 21/05/2007;
“Ao segundo musical, a banda arriscou um texto complexo e saiu vitoriosa. Maldoror estreou na sua Braga natal. (…) Em duas noites seguidas a banda fez vibrar o lotado Theatro Circo. (…) A adaptação de Os Cantos de Maldoror é uma aposta ganha e impõe-se que circule de Norte a Sul do País.” Carlos Correia in Focus de 23/05/2007;
“Será que este irresistível, castrador e selvagem “Maldoror” vai pisar muitos palcos por este país fora? Deseja-se que a resposta seja ferozmente positiva! Porque a vida também é bela quando o feio, o obsceno e o repugnante são tão bem cantados/representados.” Carlos Araújo in Diário de Aveiro de 31/05/2007.
Dando cumprimento ao desiderato de levar o espectáculo ao maior número possível de palcos, “Maldoror” segue agora em digressão para mais oito apresentações nacionais, ficando reservada a despedida para o mesmo Theatro Circo de Braga onde aconteceu a estreia. São estes os locais onde “Maldoror” poderá ser visto:
TOUR 2008:
Torres Novas – Teatro Virgínia (dia 23 de Fevereiro pelas 21h30)
Viseu – Teatro Viriato (dias 7 e 8 de Março pelas 21h30)
Leiria – Teatro José Lúcio da Silva (dia 13 de Março pelas 21h30)
Faro – Teatro das Figuras (dia 5 de Abril pelas 21h30)
Estarreja – Cine Teatro de Estarreja (dia 12 de Abril pelas 22h00)
Lisboa – Grande Auditório da Culturgest (dia 23 de Abril pelas 21h30)
Braga – Theatro Circo (dia 3 de Maio pelas 22h00)
MALDOROR (o disco)
A “Maldoror”, o espectáculo que os Mão Morta apresentaram no Theatro Circo de Braga, a 11 e 12 de Maio de 2007, baseado no livro “Os Cantos de Maldoror” que Isidore Ducasse, sob o pseudónimo de Conde de Lautréamont, deu à estampa nos finais do séc. XIX, Nuno Couto e Filipe Lourenço gravaram-lhe o som ao vivo, que foi depois misturado para a obtenção de uma obra autónoma.
É essa obra que agora a Cobra edita em disco, o primeiro álbum duplo do grupo, que se organiza como uma colecção de canções e ambientes sonoros por onde a voz de Adolfo Luxúria Canibal interpreta as visões e as histórias retiradas das páginas de Isidore Ducasse, dando-lhes espessura e mistério. Trabalho conceptual, na linhagem do que a banda já havia feito com “Müller no Hotel Hessischer Hof”, este “Maldoror”, 10.º álbum de originais da banda, constitui um mergulho no mundo terrível do herói homónimo, povoado por homens com cabeça de pelicano, acoplamentos horrorosos, naufrágios, violações, combates sem tréguas…
“Maldoror” é uma edição de luxo, limitada a 3.000 exemplares e vendida exclusivamente nos teatros onde o espectáculo é apresentado, que tem o formato de um pequeno livro de capa rígida forrada a tecido contendo os excertos de “Os Cantos de Maldoror” utilizados acompanhados por ilustrações da artista plástica Isabel Lhano. Não haverá reedições.
Ficha Técnica
Selecção de texto, versão portuguesa e adaptação de Adolfo Luxúria Canibal a partir do texto original francês de Isidore Ducasse, O Conde de Lautréamont.
Música original de Miguel Pedro, excepto “O Herói (pt. 2)”, original de António Rafael, e “O Sonho”, original de Vasco Vaz. “A Prostituição” contém sampler construído e cedido por Zé dos Eclipses.
Interpretação por Mão Morta – Adolfo Luxúria Canibal: voz / Miguel Pedro: electrónica e bateria / António Rafael: teclados e xilofone brinquedo / Sapo: guitarra / Vasco Vaz: guitarra e xilofone brinquedo / Joana Longobardi: baixo e contrabaixo.
Gravado ao vivo no Theatro Circo, em Braga, a 11 e 12 de Maio de 2007, por Nuno Couto, com assistência de Filipe Lourenço.
Misturado e masterizado por Nuno Couto em Novembro e Dezembro de 2007 nos Estúdios Boom, em Vila Nova de Gaia.
Pintura da capa e ilustrações de Isabel Lhano.
Design gráfico e paginação de Andreia Alves Mendes.
DISCO 1
1. O HERÓI – pt. 1 (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
2. O HERÓI – pt. 2 (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – António Rafael)
3. A MALDADE (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
4. A PROSTITUIÇÃO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
5. A MENINA (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
6. O NAUFRÁGIO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
7. A CÓPULA (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
8. A POESIA (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
DISCO 2
1. A PORCARIA (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
2. O SONHO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Vasco Vaz)
3. O ESCARAVELHO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
4. O PEDERASTA (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
5. O BELO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
6. A POÇÃO (Isidore Ducasse / Adolfo Luxúria Canibal – Miguel Pedro)
7. O HERÓI – pt. 1 (Instrumental) (Miguel Pedro)